sábado, 9 de maio de 2020

The World That Never Was

Sempre existirá em nós esse fantasma horrível e melancólico do mundo como ele nunca foi; Aquele que aparece e senta, invisível, do nosso lado durante as madrugadas de insônia regadas a analgésico e blues…
Sempre existirá essa necessidade cafona de explicar pra nós mesmos as nossas boas intenções, a despeito de quanta verdade exista nisso; Essa persistência de, em algum ponto da tênue linha da vida, justificar, por uma questão de sobrevivência, tudo aquilo que não somos e a distância entre a pessoa no espelho e a pessoa que gostaríamos de ser na realidade, como esse titã, indiferente. inalcançável...
E quando finalmente acharmos que nos tornamos essa pessoa, olharemos pra trás tentando ter orgulho de tão pouco, se formos honestos, percebendo que, na verdade, a pessoa que projetamos para a realidade de hoje não existe, e que essa que existe hoje também projeta algo que nunca será palpável dentro da nossa compreensão de existência.
Talvez só nos reste este esforço teimoso e absurdo para encurtar a distância…
E talvez seja assim, entre nossos pequenos vícios e a decepção daquilo que nunca seremos, que o mundo acaba conosco.

(Dedicado a E.V.)

segunda-feira, 4 de março de 2019

Subjuntivo

Por mim eu me abraçava a você como um coala se abraça à arvore; 
Por mim eu te colocava nos braços e te levava a todos os meus lugares preferidos,
onde eu te mostraria como se fosse a coisa mais perfeita do mundo aos interessados ou não;
Por mim eu te orbitaria, como os astros menores fazem com os maiores, apenas pra ficar te olhando e pensando na sorte que seria poder estar sempre à tua volta;
Por mim todo mundo saberia que os dias vem e vão, acumulando-se entre semanas e meses 
e eu não deixo de pensar em você, na tua voz ou teu sorriso tímido de ar discreto, escondendo o teu semblante dolorido... 
E faço isso do meu jeito, quietinho, rindo baixinho pelos cantos, pensando que sou feliz de saber que você existe, que está bem e que tem amor;
Que, embora durma pouco, hora ou outra um sonho bom te encontrará, e eu gosto de fingir que fui eu quem mandei,
como os abraços que imagino emprestar ao seu cobertor ou os beijos que te mando pelo vento, em total segredo, esperando paciente que ele te entregue.
Por mim seria tudo como tu queres, Mas creio que, exatamente por eu querer tudo do teu jeito, as coisas não podem ser do meu- e eu aceito-.
Espero te encontrar, em outra vida, mais cedo.
Nessa eu quero apenas a tua felicidade e de resto, por mim, tudo bem.

domingo, 5 de agosto de 2018

A morte do Lisianthus


Se os meus olhos encherem d’água,
Profundos de novos prantos,
Não te ocupes da minha mágoa,
Eu choro a morte do Lisianthus.
Que eu cuidei por toda uma vida;
Que busquei como busco a pureza,
Que amei de um amor sem medida,
Que eu quis ter como plena certeza,
E que agora esvai-se perdida
Deixando-me trôpego pelos cantos,
Pois antes fosse só outra ferida,
Mas eu choro a morte do Lisianthus.
Que levou-me parte da alma,
Que sangrou com os meus machucados
Que matei ao pecar pelo excesso,
Que morreu inocente e cansado.
E sei que haverão outras flores
Com doces perfumes e nomes tantos...
Mas não sei se outros amores,
Pois eu choro a morte do Lisianthus.


sexta-feira, 20 de julho de 2018

íon (para a Violeta)

Das flores que já conheci
Que enfeitariam qualquer rima feita
Esqueço que um dia as vi,
Eu só tenho olhos para a violeta.

Pois já escrevi sobre rosas,
Sobre lírios de excelsa pureza;
Sobre orquídeas de todos os tipos
Girassóis de altiva certeza...

Mas ao ver seu azul sob a grama
Foi que soube certo que a procurava
A flor mais modesta de todas
Onde a mais suave ternura pousava.

E sei que outras flores há,
Até mesmo camélias de beleza perfeita,
Mas a outra flor já não posso escrever,
Pois só tenho versos para a violeta.

sexta-feira, 25 de maio de 2018

A indireta

Eu não vou te dizer coisa alguma,
talvez nem hoje, nem amanhã
nem tão cedo...
E não é por nenhuma negação da minha vontade, nenhuma abnegação bem medida de escritor meia-boca...
Eu não vou te dizer nada porque,
Embora adore falar contigo, eu aprendi
Que não te preciso.
Eu te quero como quero bem às aves,
Como quero aos bichinhos inocentes do mundo;
Como quem vai ao teatro e não tem nenhuma intenção de levar se não a experiência consigo.
Eu te desejo um bem absurdo, mas aprendi a querer bem sem pensar em retorno;
Sem procurar laços, sem envolver nada...
Eu aprendi que ao abraçar não te via de frente e não podia realmente saber de ti só pelo som dos teus suspiros.
Eu não vou te dizer nada,
E não vou dizer porque prefiro observar as coisas sem minha intervenção nelas.
Pensar sobre, dedicar os versos de uma ternura sem preço e um carinho sem identidade,
Assim, indigente, que aparece e some do mundo sem dar satisfação,
Que apenas evanesce e nisso encontra seu maior valor...
Eu não vou mais te dizer coisa alguma
E esse silêncio é sim uma canção de amor.